Ciel du Cheval, o Grand Cru de Washington

Terça-feira, 31 de maio de 2016

A identificação do vinho pela uva e não pelo local foi uma das maneiras encontradas pelos produtores do chamado "novo mundo" para desmistificar o vinho junto aos consumidores.  Essa fórmula, inventada pelos norte-americanos no decorrer dos anos 1970, passou a ser amplamente empregada por produtores de países do novo mundo.


Não há dúvida de que essa fórmula de identificação do vinho ajudou a formar novos consumidores e enófilos, mostrando-se extremamente útil em países cuja tradição vitivinícola era recente.

Essa fórmula, contudo, acabou propiciando uma homogeneização do vinho, passando os consumidores a escolher pela cepa - não raro sem considerações mais atentas sobre o local de origem, considerando,no máximo,  as denominações maiores ou os produtores mais conhecidos.


No entanto, com o passar dos anos e uma maior educação dos apreciadores de vinhos, esse cenário no novo mundo vem mudando, com consumidores buscando vinhos que reflitam o local de origem, o terroir.


Há, assim, uma forte tendência em se destacar o local de origem do vinho, com um aumento em países do novo mundo de denominações de origem e seus equivalentes (por exemplo, no Chile, as divisões de alguns vales em até três microrregiões, Andes, Entre Cordilleras e Costa), destacando cada vez mais as particularidades do terroir local.

Seguindo essa tendência, houve um drástico aumento no número de AVAs (American Viticultural Area) nos Estados Unidos nas últimas décadas, inclusive com a criação de AVAs dentro de outras AVAs, como, por exemplo, Red Mountain em Washington inserida dentro da AVA Yakima Valley, a qual, de seu turno, está inserida na AVA Columbia Valley (sobre AVAs e terroir na Califórnia leia aqui e aqui). Esse movimento, apesar das descabidas críticas de que confundiria o consumidor de vinhos, se mostra primordial para o fortalecimento de uma identidade cultural-vinícola e construção da própria noção de terroir.


Dentro desse contexto, diversos produtores na Califórnia, Washington e Oregon têm ido além e destacado em seus rótulos não apenas a denominação de origem (a American Viticultural Aerea) mas também o nome do vinhedo, isso sem olvidar em destacar a cepa ou as cepas com que elaborado o vinho.


Esse destaque do vinhedo no rótulo do vinho tem inspiração clara nos crus franceses, sobretudo de regiões como Bourgogne, Alsace e Champagne, em especial a primeira. Claro que sem qualquer sistema oficial de classificação como ocorre nas regiões francesas mencionadas.

Em poucos casos chega-se até mesmo a indicar parcela específica do vinhedo, os blocks, o que muito se assemelha aos Climats em relação aos vinhedos Premier e Grand Cru da Bourgogne.


Em suma, a indicação de vinhedos em vinhos americanos merece ser conhecida, até porque pode ser mais um guia na hora da escolha de vinhos em viagens aos Estados Unidos, mormente quando diante de inúmeras opções e pouca disponibilidade de espaço na bagagem.


Em Washington, a segunda maior região produtora de vinhos dos Estados Unidos, reconhecida pela excelente relação qualidade-preço (leia mais aqui), o vinhedo Ciel du Cheval é um dos mais renomados e reconhecido pela alta qualidade de seus vinhos.

Embora o nome nos remeta à vizinha AVA Horse Heaven Hills, o vinhedo Ciel du Cheval está localizado no centro de Red Mountain, AVA datada do ano de 2001 e a menor do Estado de Washington.


O vinhedo foi estabelecido em 1975 e, desde então, tem fornecido uvas para diversos produtores (Fidelitas, Seven Hills Winery, Mark Ryan, Betz Family, Cadence, Andrew Will etc...) que possuem contratos para fornecimento de uvas oriundas do vinhedo. Daí porque podemos encontrar vinhos elaborados a partir de uvas do Ciel du Cheval de diferentes vinícolas, muitas sequer localizadas em Red Mountain, como a Seven Hills Winery (um dos meus preferidos). Desde 2012 os proprietários passaram a produzir vinhos próprios, somente com uvas do Ciel du Cheval, com o projeto Côtes de Ciel.


Ciel du Cheval possui 120 acres, dos quais 102 são de vinhas, 3 acres sem cultivo, e 15 acres com estradas e edificações diversas.

O vinhedo é dividido em 36 parcelas, com medida de 2,84 acres, cada qual com seu próprio planejamento no que tange à exposição e à orientação das vinhas, planejamento de irrigação etc... No entanto, cultivo mecânico, não utilização de herbicidas, e colheita manual são práticas comuns em todo o vinhedo.


Há diversas variedades plantadas no Ciel du Cheval, tais como Barbera, Cabernet Franc, Cabernet Sauvignon, Cunoise, Grenache, Merlot, Mourvédre, Nebbiolo, Petit Verdot, Pinot Gris, Roussanne, Sangiovese, Syrah e Viognier.


Os vinhos elaborados com a Cabernet Sauvignon, sejam varietais, sejam cortes bordaleses, e os elaborados com a Syrah são incríveis e de uma elegância única, os meus preferidos.


O que poucos sabem é que o reconhecimento da alta qualidade das uvas do vinhedo Ciel du Cheval se deve também ao fato de suas uvas terem sido utilizadas nos blends de cult wines de Washington, como os Quilceda Creek 2002, 2003 e 2005, os primeiros vinhos do Estado a receberem 100 pontos do crítico Robert Parker, trazendo fama à região.


Quando se deparar com uma garrafa de um vinho elaborado com uvas do vinhedo Ciel du Cheval, não hesite e não perca a oportunidade.


Cheers!

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