Vinos de Pago, uma Exclusiva Classificação de Vinhos Espanhóis 


Quarta-feira, 01 de maio de 2024.

A Espanha, que ao lado da França e da Itália, é um dos três maiores produtores de vinhos do mundo, conta com a maior área com vinha plantada do planeta. 

Com uma vasta riqueza enológica, a Espanha produz os mais variados estilos de vinhos: potentes vinhos tintos com longa capacidade de guarda; brancos leves e frutados ou mais estruturados; rosados em estilos diversos; espumantes; vinhos doces únicos; até seus famosos fortificados (DOs Jerez, Manzanilla-Sanlúcar de Barrameda e Montilla-Moriles). 

Muitas uvas de grande reconhecimento internacional são espanholas, como a Tempranillo, Monastrell (Mourvèdre), Mazuelo/Cariñena/Samsò (Carignan) e a Garnacha (Grenache). 



Após a II Guerra Mundial, a Espanha experimentou um longo período de isolamento sob a ditadura de Franco. Porém, com o fim do regime franquista, na década de 1970, a Espanha iniciou uma retomada de seu protagonismo no mundo do vinho. Com sua entrada na União Europeia, o país recebeu investimentos, e a indústria vinícola adotou novas técnicas e tecnologias, sem se descuidar da tradição. 

Nesse contexto, em 1996, buscando um alinhamento com as diretrizes da União Europeia, a Espanha atualizou seu sistema de denominações de origem protegida, com uma posterior e profunda reforma em 2003 que introduziu novas categorias como Vino de Pago (VP) e Vino de Calidad con Indicación Geográfica (VC).


Hoje a classificação espanhola segue os standards da União Europeia, com três grandes categorias: vinhos com denominação de origem protegida (DOP); vinhos com indicação geográfica protegida (IGP - com regras “menos rigorosas” que as das DOPs) e vinhos sem indicação geográfica. 


Como em outros países europeus produtores de vinhos, como na Itália, por exemplo, a Espanha mantém o uso de nomenclaturas tradicionais, que correspondem ou se encaixam nas categorias da União Europeia.


O grande ponto a se destacar reside na categoria denominação de origem protegida (DOP), que conta com subcategorias. 

Assim, na categoria denominação de origem protegida (DOP) encontramos as seguintes subcategorias:


1) Vino de Pago (VPs): essa subcategoria será detalhada mais adiante, existindo, segundo dados de dezembro de 2023, 24 VPs;

2) Denominación de Origen Calificada (DOCa): o nível mais alto das apelações de origem espanholas. Para se chegar a tal subcategoria, a região deve ter mantido o status de Denominación de Origen (DO) por um mínimo de dez anos e os vinhos devem ser produzidos e engarrafados dentro da região. Há ainda um outro critério, qual seja, os vinhos devem, em média, custar pelo menos o dobro da média nacional dos preços dos vinhos DOs. Há atualmente apenas duas DOCas, Rioja e Priorato, que inclusive contam com classificações internas próprias em um sistema de inspiração borgonhesa (Rioja: Viñedos Singulares, Vinos de Municipio, Vinos de Zona; Priorato: Gran Vinya Classificada, Vinya Classificada, Vi de Paratge, Vi de Vila);


3) Denominación de Origen (DO): a principal categoria, estabelecendo diversos requisitos como uvas autorizadas, níveis de produção, regimes de amadurecimentos dos vinhos, métodos enológicos. São zonas de produção com qualidade reconhecida há pelo menos cinco anos. Há, segundo dados oficiais de fevereiro de 2024, 70 DOs (inclusa a recente DO Campo de Calatrava, em Castilla-La Mancha);


4) Vino de Calidad con Indicación Geográfica (VC): uma espécie de categoria intermediária entre os Vinos de la Tierra (VT), que são os vinhos com indicação geográfica protegida e as DOs. A região precisa ficar um mínimo de cinco anos nessa categoria antes de poder se candidatar a DO. Há apenas 7 VCs atualmente (dados oficiais atualizados até dezembro de 2023).


A palavra pago possui diversos significados em Espanhol, desde pagamento, abono, até usos específicos na área vitivinícola. Nessa última a palavra pago é usada não apenas como uma DO, mas também como nome de uma vinícola ou propriedade (equivalente às “quintas” de Portugal) ou como sinônimo para vinhedo único (os single vineyards).

Tampouco devemos confundir os Vinos de Pago com a organização privada Grandes Pagos de España, que congrega 35 vinícolas de 8 regiões espanholas com o objetivo de promover alguns de seus vinhos de vinhedos únicos e de alta qualidade.


Já a subcategoria Vino de Pago propõe uma classificação oficial com base em determinadas propriedades que possuem solos ou microclimas únicos. 


Os Vinos de Pago são uma DO por si só, devendo ser representativos da área em que estão, produzidos e engarrafados na própria propriedade.

Um ponto de destaque é que cada propriedade com status de Vino de Pago estabelece suas próprias regras, como uvas autorizadas, viticultura, vinificação e amadurecimento dos vinhos.


Vale lembrar que para uma propriedade chegar ao status de Vino de Pago é necessário que antes esteja inserida em uma DO, como o recente caso da Abadía Retuerta, antes pertencente à DO Ribera del Duero.


Na verdade, os Vinos de Pago se assemelham muito com apelações de outros países que são monopólios, isto é, pertencem a apenas um mesmo produtor, como, v.g., Château Grillet e Romanée-Conti na França, ou Bolgheri Sassicaia na Toscana.


Há, segundo dados de dezembro de 2023, 24 Vinos de Pago, concentrando-se nas regiões de Valencia (Vera de Estenas, Los Balagueses, El Terrerazo, Chozas Carrascal), Castilla y León (Abadía Retuerta, Dehesa Peñalba, Urueña), Castilla-La Mancha (Finca Élez, Dominio de Valdepusa – essas os dois primeiros VPs da Espanha - Calzadilla, Campo de La Guardia, Casa del Blanco, Dehesa del Carrizal, El Vicario, Guijoso, La Jaraba, Los Cerrillos, Pago Florentino, Vallegarcia), Aragón (Aylés) e Navarra (Bolandin, Pago de Arínzano, Pago de Otazu, Pago de Irache).


Uma reflexão crítica, por fim, que precisamos ter reside em que ponto da hierarquia das DOs estão os Vinos de Pago. Não vejo, até mesmo por questões de posicionamento no mercado (preço, prestígio), a superioridade em relação às DOCas ou DOs comuns. Os Vinos de Pago, em verdade, estão fora da pirâmide, em paralelo com as DOCas ou DOs, de forma muito similar às subcategorias Viñedos Singulares da Rioja ou os vinhos Gran Vinya Classificada ou Vinya Classificada do Priorato.


¡Salud!

Comentários (Respostas)