Desbravando as Denominações de Origem Italianas - Vernaccia di Oristano D.O.C.

Segunda-feira, 1 de março de 2021

Produzindo vinhos em praticamente todas as suas regiões, do norte ao sul, passando por suas ilhas, a Sardegna e a Sicilia, a Itália apresenta uma imensa riqueza enológica, tão vasta quanto sua culinária. 


Existem na Itália, segundo Jancis Robinson, Julia Harding e José Vouillamoz (Wine Grapes – A Complete Guide to 1,368 Vine Varieties, Including Their Origins and Flavours) cerca de 377 variedades autóctones, o que demonstra a riqueza da viticultura italiana.


Há uma enorme gama de vinhos produzidos em toda a Itália: brancos, espumantes, frisantes, rosados, laranjas/âmbar, tintos, de sobremesa, nos mais variados estilos, alguns bem fora do usual como, por exemplo, vinhos elaborados com a técnica do appassimento (e.g. Amarone de Valpolicella; Sforzato di Valtellina). 


A Itália conta ainda com, aproximadamente 334 D.O.C. (Denominazione di Origine Controllata), 74 D.O.C.G. (Denominazione di Origine Controllata e Garantita) e 118 I.G.T. (Indicazione Geografica Tipica).


Nesse ponto, vale reprisar uma breve observação sobre o novo sistema europeu de hierarquização de vinhos.


Desde primeiro de agosto de 2009, em decorrência de regras comunitárias europeias, a hierarquização dos sistemas de vinhos dos países europeus mudou, passando a adotar a seguinte forma (em suas variações nos diversos idiomas nacionais dos países europeus):

A) vinhos de denominação de origem protegida;


B) vinhos com indicação geográfica protegida; 


C) vinhos genéricos com safra e uva indicados;


D) vinhos genéricos (sem qualquer informação de safra e uva).


No entanto, o regulamento comunitário europeu ressalvou a possibilidade de que os países membros continuassem a utilizar as próprias menções tradicionais.


Dessa sorte, os vinhos com Denominazione di Origine Protetta passaram a abarcar os vinhos D.O.C. (Denominazione di Origine Controllata) e D.O.C.G. (Denominazione di Origine Controllata e Garantita); e os vinhos com Indicazione Geografica Protetta passaram a englobar os vinhos I.G.T. (Indicazione Geografica Tipica), restando autorizadas, como dissemos antes, as menções tradicionais nos rótulos alternativamente ao uso das novas nomenclaturas.

Por conta de produções pequenas, o consumidor enófilo nem sempre consegue ter acesso a vinhos de regiões ou denominações menos famosas (leia sobre uma aqui).


Uma das regiões italianas que guarda diversas surpresas ao enófilo explorador é a Sardenha (em italiano, Sardegna; em dialeto local, o sardo, Sardigna).


A Sardegna, localizada a 240 km do litoral italiano, é a segunda maior ilha do mar Mediterrâneo, contando como vizinhos mais próximos a Córsega e a Sicília, e produzindo vinhos que a cada dia ganham a atenção dos especialistas. 

Dentre os tintos, destaque para os vinhoselaborados com as uvas Bovale Sardo (Graciano), Carignano (Carignan), Monica e Cannonau (Grenache). Já entre os brancos destacam-se os vinhos elaborados com a Vermentino (Rolle, na França), Nasco, Girò, Moscato Giallo e a Vernaccia di Oristano (que apesar do nome não deve ser confundida com a Vernaccia di San Gimignano).


Recentemente tive a grata surpresa de provar um vinho sardo, o Contini Componidori Vernaccia di Oristano 2013, elaborado com um estilo similar ao Vin Jaune do Jura, na França.


A Vernaccia di Oristano é a primeira DOC (Denominazione di Origine Controllata) da Sardenha, ganhando tal status em agosto de 1971. 


Os vinhos são elaborados exclusivamente com a uva Vernaccia di Oristano, tida como trazida para a ilha pelos Fenícios cerca de 800 a.C. quando fundaram o porto de Tharros. Devem ser exclusivamente oriundas das comunas (cerca de 20) da província de Oristano.


Há alguns estilos de vinhos produzidos na denominação Vernaccia di Oristano, dos secos aos doces.


O ponto comum a todos os estilos dos vinhos Vernaccia di Oristano DOC, em termos de vinificação, reside na formação da “flor” nas barricas em que são armazenados os vinhos, tal como na elaboração do Vin Jaune.


Após o término da fermentação, o vinho é armazenado em barris de castanheira e de carvalho, que não são preenchidos totalmente. Os barris são então guardados em um ambiente aerado, com variações naturais de temperatura.


Cria-se então um véu, uma cobertura de leveduras sobre o vinho chamada de “flor”. A flor passa ao longo dos meses por um processo químico, transformando os ácidos e o acetato etílico em aldeídos, protegendo o vinho do contato direto com o oxigênio. Essa oxidação controlada acaba por criar um vinho com longo potencial de amadurecimento, com notas de nozes, amêndoas, avelãs, típicas de vinhos com oxidação deliberada.


Alguns dos vinhos Vernaccia di Oristano DOC podem ainda passar pelo processo chamado de Solera, aqui se aproximando mais do processo dos vinhos de Jerez.


Em muita apertada síntese (até porque explicar esse sistema demandaria um texto completo), o sistema de Solera é formado por vários níveis de barricas com vinhos com diferentes idades médias e o processo consiste em mover vinho entre vários níveis, obtendo-se um vinho que é uma mistura de vinhos de diversas idades. 


A diferença dos vinhos Vernaccia di Oristano DOC em relação aos vinhos de Jerez reside no fato de, em regra, não serem “fortificados” (adição de aguardente vínica  após a fermentação), além de poderem passar ou não pelo sistema de Solera.  


O vinho degustado, o Contini Componidori Vernaccia di Oristano 2013, era seco, não tendo passado pelo sistema de Solera nem sendo fortificado. Apresentava uma bela cor laranja. No nariz, aromas de avelãs, nozes e amêndoas se sobressaiam, até mesmo pela oxidação e pela evolução, acompanhados de mel e damasco seco. Na boca, apresentou uma acidez alta, refrescante, com toques salinos, além de um longo final. 


Para os apreciadores desse estilo de vinho, uma bela descoberta!


Salute!

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