Château Cheval Blanc – Conhecendo um mito

Segunda-feira, 29 de maio de 2017

Château Cheval Blanc. Um dos mais lendários vinhos do mundo, ocupando o ápice da classificação de vinhos de Saint-Émillion desde sua criação em 1955 (Premier Grand Cru Classé A). A mera menção de seu nome já é o suficiente para gerar expectativa em qualquer enófilo. Degustar uma de suas safras é sempre uma experiência singular. Visitar a propriedade, então, é uma daquelas experiências únicas e inesquecíveis.

Foi esse sentimento que tomou conta de mim em uma tarde fria e ensolarada de novembro ao me aproximar dos portões do Château Cheval Blanc. Já havia tido o privilégio de degustar algumas poucas e inesquecíveis safras do Château Cheval Blanc, e que me vinham à mente conforme ultrapassava os portões da propriedade.


A história do Château Cheval Blanc remonta ao ano de 1832. Nesse ano, a família Ducasse adquiriu parte da atual propriedade do Château Figeac, que pertencia à Condessa Felicité de Carle-Trajet. Até então essa parte da propriedade era chamada de Le Barrail de Cailloux.


Naquela época o Château Figeac possuía 200 hectares e a Condessa decidiu vender partes da propriedade, contribuindo para a criação de diversas vinícolas. Isso explica a razão de diversas propriedades manterem o nome Figeac (e.g. Château La Tour Figeac, Château La Tour du Pin Figeac, Château Yon Figeac).


Posteriormente, em 1838, a família Ducasse adquiriu mais parcelas do Château Figeac, o que é hoje a maior parte da propriedade.


Em 1852 Mille Ducasse casou-se com Jean Laussac-Fourcaud, e o dote de Mille Ducasse incluía os vinhedos Château Cheval Blanc.


A família Laussac-Fourcaud construiu o château, sendo esse edifício até hoje utilizado. E continuou, nos anos seguintes, a adquirir vinhedos contíguos, aumentando o tamanho do da propriedade. Em 1871, o Château Cheval Blanc possuía um total de 39 hectares de vinhedos em Saint-Émilion, permanecendo com esse tamanho até hoje.

Nos primeiros anos, os vinhos do Château Cheval Blanc eram vendidos como Château Figeac. No entanto, à medida em que recebiam prêmios, o vinho passou a ostentar um rótulo com o nome Château Cheval Blanc, fazendo jus às medalhas que recebia.


Na primeira metade do século XX, o Château Cheval Blanc produziu vinhos de altíssima qualidade, aumentando sua reputação, inclusive o mítico Château Cheval Blanc 1947, que muitos apontam como um dos melhores vinhos já elaborados.

Em 1998, o Château Cheval Blanc foi comprado por Bernard Arnault e pelo Barão Albert Frère, passando a propriedade a ser gerida por Pierre Lurton.


Posteriormente, em 2009, o grupo LVHM adquiriu a parte de Bernard Arnault na propriedade.


Em 2011, com projeto do célebre arquiteto e ganhador do Pritzker Architecture Prize Christian de Portzamparc, o Château Cheval Blanc encerrou uma ampla e completa reforma. A reforma incluiu um moderno edifício com nova adega, sala de vinificação com novos tanques, nova área de degustação e novo projeto de paisagismo dos jardins.


Embora o novo edifício possua linhas arquitetônicas modernas e arrojadas, há harmonia com paisagem do local, inclusive com o antigo Château, não ofuscando este, nem se destacando em demasia, talvez até mesmo por estar um pouco abaixo de uma colina. Dali temos belas vistas da paisagem não apenas de Saint-Émillion, mas também da vizinha Pomerol.


Nas novas instalações foram construídos os novos tanques de concreto, projetados especialmente para o Château Cheval Blanc a partir das orientações técnicas da equipe de Pierre Lurton. Os vinhos de cada variedade e da cada parcela dos vinhedos são vinificados separadamente em seus respectivos tanques de concreto, que variam de tamanho.


Iniciamos nossa visita pelos vinhedos, e ali aprendemos muito sobre o privilegiado e único terroir do Château Cheval Blanc.


A propriedade, como dito, possui 39 hectares de vinhedos plantados, com três tipos diferentes de solos. Embora os vinhedos sejam contíguos, não há uma uniformidade de solo, justamente o que aporta mais complexidades aos vinhos. 40% dos vinhedos possuem solos profundos com cascalho e uma multiplicidade de tipos de argila, incluindo a famosa argila azul - que dizem ser um dos segredos desse notório vinho. 20% consistem em argila arenosa com depósitos de ferro. Já os 40% restantes possuem solos profundos com cascalho. Importante destacar ainda dois pontos: a existências de cinco colinas de cascalho na propriedade com cerca de 38 metros de altura, bem como a proximidade da propriedade com a divisa com a AOC (Appellation d’Origine Contrôlée) vizinha de Pomerol, o que leva alguns especialista a dizer que o Cheval Blanc reflete um pouco do estilo da apelação vizinha (não obstante o predomínio quase total da Merlot nos vinhos desta última).


Os vinhedos do Château Cheval Blanc são divididos em 45 seções, cada um tratado como se fosse um vinhedo próprio em virtude das diferenças de solo, de idade das vinhas, da variedade, dentre outros fatores. Os vinhedos são compostos de 49% Cabernet Franc, 47% Merlot, 4% Cabernet Sauvignon. Já se chegou a ter 1% de Malbec, que, no entanto, não chegou a ser utilizado.

O assemblage do Grand Vin varia safra a safra, atendendo a especificidades destas, sendo certo que nas últimas safras há uma tendência de predomínio da Cabernet Franc. 


As vinhas da propriedade tem uma média de 45 anos de idade, embora haja vinhas mais antigas, cerca de 8 hectares de vinhas de Cabernet Franc plantadas na década de 1950 e algumas parcelas plantadas na década de 1920.


A equipe do Château Cheval Blanc, no entanto, utiliza as vinhas mais antigas para seleção de clones, um programa que começou em 1996 buscando manter a identidade dos vinhedos. 


Algo que realmente me surpreendeu foi a informação de que a equipe do Château Cheval Blanc não espera, durante a colheita, até que todas as frutas das vinhas de cada parcela alcancem um grau de madurez fenólica total, colhem-nas antes. O assemblage das diferentes uvas de parcelas distintas adiciona complexidade, frescor e aquele tom aveludado e profundo aos vinhos.


Continuando, visitamos as instalações da vinícola, conhecendo a sala das barricas e a sala dos novos tanques de cimento. 


Aprendemos que a vinificação dos vinhos do Château Cheval Blanc ocorre, como já mencionado antes, em 52 tanques de cimento, com tamanhos variados, onde a fermentação malolática ocorre. Posteriormente, é feito o assemblage, e os vinhos são envelhecidos em barricas novas de carvalho francês durante 18 meses.

Importante lembrar que o Château Cheval Blanc produz, desde a safra 1988, um segundo vinho, Le Petit Cheval, que é envelhecido em 50% de barricas novas de carvalho francês, correspondendo a metade da produção do Grand VIn. No entanto, em 1991, uma safra sofrível, apenas o Le Petit Cheval foi produzido. Já em 2015, pela primeira vez, apenas o Château Cheval Blanc foi produzido por conta da alta qualidade da safra (apenas uma parcela ínfima foi desclassificada). 


Também a partir da safra 2015, o Château Cheval Blanc, após quase uma década de experimentos, passou a produzir um vinho branco: Le Petit Cheval - Bordeaux Blanc. 



Trata-se de um Bordeaux Blanc produzido, incialmente, somente com a uva Sauvignon Blanc (há planos do uso de 20% de Sémillion a partir de 2018). As uvas são provenientes de um vinhedo defronte ao Château Cheval Blanc, do outro lado da estrada, e anteriormente pertencentes ao Château La Tour du Pin adquiridos faz alguns anos pela vinícola. 


Por conta das regras da AOC (Appellation d’Origine Contrôlée) Saint-Émillion não permitirem o uso de cepas brancas, o referido vinho é classificado com um Bordeaux branco genérico. Na verdade, a elaboração de vinhos brancos pelos grandes Châteaux de Bordeaux, em especial no Médoc, é um tendência relativamente recente e que, pelo visto, veio para ficar (note-se que não estamos nos referindo aos vinhos brancos secos de Graves, Pessac-Léognan ou Sauternes). 



Finalizando nossa visita, degustamos um Château Cheval Blanc 2011. Uma safra ofuscada pelas duas incríveis safras anteriores, porém mesmo assim uma safra clássica, com tempo seco (mas não excessivo) durante a época do amadurecimento, refletindo a filosofia da vinícola. Elaborado com 52% de Cabernet Franc, 47% de Merlot e 1% de Cabernet Sauvignon, apresentava um rubi profundo, opulento, com o aveludado, quase seda, característico desse vinho, com uma bela camada de frutas vermelhas e negras, demonstrando grande potencial de guarda. O retrogosto parecia interminável. Um vinho inesquecível!


Santé!

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