A Alsace e seus Vinhos: Uma Breve Introdução – Parte II

Quarta-feira, 23 de outubro de 2019

Em post anterior, vimos que a cultura alsaciana - da qual seus vinhos são um dos grandes destaques - surge a partir da fusão entre as culturas alemã e francesa, decorrente de séculos de História, com sucessivas mudanças na titularidade do domínio da região.


E apesar da forte influência germânica o vinho alsaciano possui fortes traços franceses, como a presença da noção de terroir, e um sistema de classificação de vinhedos tipicamente francês. 

Em decorrência da grande variedade de solos existente na Alsace (xisto, calcário, vulcânico, marga, granito, gnaisse, arenito, areia, argila, loess etc...), encontrados sós ou mesclados nas mais variadas combinações, somada aos diversos microclimas existentes na região - ideais para uma ou outra variedade de uva – a clássica noção francesa do vinho como expressão de um local único passou a se sobrepor à valorização - vigente até pouco tempo - da cepa.


Em verdade, o sistema de denominações alsaciano é relativamente recente, tendo a legislação entrado em vigor apenas em 1962. Já os primeiros Grand Crus apenas começaram a se tornar AOPs (Appellation d'Origine Protégée) a partir de 1975 (cada Grand Cru é uma AOP própria) e o Crémant d’Alsace apenas recebeu status de AOP em 1976.

Após a criação (contínua) das denominações autônomas Grand Cru (cada Grand Cru é uma AOP autônoma), e de forma a explorar e destacar ainda mais as diversas nuances e especificidades do terroir alsaciano, a partir de 2011 surgiram, dentro da AOP Alsace, as subcategorias Communal e Lieu-Dit.


Há, inclusive, produtores, como o cultuado Marcel Deiss, que defendem a criação de uma subcategoria de Premiers Crus, hierarquicamente abaixo dos Grand Crus, inclusive com extensão aos vinhos tintos. Marcel Deiss se refere, inclusive, a alguns de seus vinhos da Alsace AOP como Lieux-Dits – Crus d'Alsace en cours de hiérarchisation (Burlenberg, Langenberg, Burg, Engelgarten etc...).

Este é o sistema atual de denominações da Alsácia e suas subcategorias: 

1. AOP Alsace (73% de toda a produção):

1.1.  Comum – Produz brancos, rosés e tintos, com uvas de qualquer parte da região;

1.2.  Comunal – Produz brancos e tintos a partir de uvas de determinado vilarejo. Há 13 vilarejos que podem ser enquadrados nessa subcategoria: Bergheim, Bliensschwiller, Coteaux du Haut Koenigsbourg, Côtes de Rouffach, Côtes de BArr, Klevener de Heiligenstein, Ottrott, Rodern, Scherwiller, St. Hippolyte, Vallée Noble, Val. St.-Grégoire, Wolxheim;

1.3.  Lieu-Dit – Refere-se a um vinhedo ou parcela de um vinhedo de notável e única expressão. Os padrões são mais rigorosos que os das demais categorias, com rendimentos mais restritivos.


2. AOPs Grand Cru (4% de toda a produção): Como ocorre na Borgonha, são os vinhedos que são classificados como Grand Cru, e não o vilarejo (como ocorre em Champagne) ou o produtor. São vinhedos considerados excepcionais por conta do solo, da exposição solar, dentre outros fatores. Essa categoria até 2021 era reservada apenas para vinhos brancos e monovarietais elaborados com as uvas Riesling, Pinot Gris, Gewürztraminer ou Muscat. Há algumas exceções a essa regra, como a autorização do uso da Sylvaner para vinhos monovarietais do Grand Cru Zotzenberg, ou ainda os Grand Crus Altenberg de Bergheim e Kaefferkopf, com detalhamentos específicos, podendo ser monovarietais ou assemblages (estes em geral decorrentes de field blends locais, ou seja, parreiras de uvas distintas misturadas no vinhedo). E, por fim, a partir da safra de 2022 os Grand Crus Kirchberg de Barr e Hengst estão autorizados a elaborar vinhos tintos (Pinot Noir) nessa categoria (texto atualizado em 2023).


3. AOP Crémant d’Alsace (23% de toda a produção): Produz vinhos espumantes somente pelo método tradicional (segunda fermentação em garrafa), podendo ser brancos (monovarietais ou cortes, com as uvas Pinot Blanc, Riesling – as duas principais -Pinot Gris, Chardonnay, Pinot Noir e Auxerrois) ou rosés, estes por maceração ou por saignée (“sangria”). Há diferentes níveis de doçura, do Extra-Brut ao Demi-Sec, de forma muito similar à da AOP Champagne.


Importante lembrar que os vinhos doces ou de sobremesa alsacianos - Vendanges Tardives e Sélections de Grains Nobles – podem se situar nas AOPs comum ou nas Grand Cru.


Por fim, há ainda rótulos com termos que não são regulamentados, como Réserve, Prestige, Réserve Personelle, dentre outros, e utilizados por alguns produtores para hierarquizar ou diferenciar certos vinhos de seu portfólio, dando-lhes um certo destaque.


Santé!

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